sábado, 24 de outubro de 2015

MILITAR # MILITARIZADO

Acerca do programa do Alexandre Garcia, que debateu entre um oficial da Policia Militar (FENEME - Federação Nacional de Militares Estaduais) e um delegado da Policia Federal sobre o "CICLO COMPLETO DE POLICIA", no Canal Globo News, transcrevemos missiva encaminhada ao mediador, pelo Cel RR Alberto Afonso Landa Camargo.

Prezado Sr. Alexandre,
Sobre o recente programa que tratou do "ciclo completo de polícia", do qual participaram como debatedores um oficial da PM e um delegado da PF, foi comentado por este último, na tentativa de colocar a PF como "melhor" que a PM, que a "PF é DESMILITARIZADA”. Visou também esta o delegado nitidamente justificar a necessidade de desmilitarização das PMs. Em outra manifestação o mesmo delegado, ainda para tentar justificar uma equivocada superioridade da PF, referiu-se à "baixa letalidade" da PF em suas operações, inferindo comparar sobre a letalidade em tese maior da PM, tentando equivocadamente induzir outros a deduzirem que a letalidade maior das PMs se dá pelo fato de serem militares e a letalidade menor da PF se dá pelo fato de ser esta civil.
É preciso compreender que os termos MILITAR e MILITARIZADO não significam a mesma coisa. O primeiro diz respeito à condição da entidade, uma adjetivação que é dada pela lei e unicamente por ela. O segundo diz respeito à destinação, à atividade para a qual é necessário o emprego de táticas, estratégias, hierarquia, disciplina e comando próprios para que a missão tenha sucesso.
Sem entrar em maiores detalhes para não alongar, é certo afirmar, portanto, que uma entidade MILITAR não precisa ser necessariamente MILITARIZADA, assim como uma entidade MILITARIZADA não precisa ser necessariamente MILITAR. Concluindo, portanto, uma entidade CIVIL pode ser MILITARIZADA, bastando que para isto tenha tal destinação, não necessariamente no todo, mas de parte da corporação, que precisa, em algum momento e em razão da operação executada, seguir parâmetros táticos, estratégicos, hierárquicos, disciplinados e de comando próprios de quem é militar.
Isto significa que a simples retirada da adjetivação de MILITAR das polícias, o que depende unicamente da mudança da lei que assim as adjetivou, não as levará necessariamente à DESMILITARIZAÇÃO, pois em algum momento, como é próprio de qualquer polícia do mundo independente de civil ou militar, ela precisará ser empregada conforme os requisitos exigidos para uma operação militar, ainda que esteja muito longe de ser comparada a uma operação de guerra. Da mesma forma como são largamente vistas as PCs dos Estados e a PF serem empenhadas em operações desta natureza e com tais e evidentes características, quer em ações reais, quer em treinamentos.
A título de exemplo, no endereço a seguir está uma parte do treinamento de policiais federais em sua própria escola, isto é, um treinamento MILITARIZADO e próprio de quem é militarizado:https://www.youtube.com/watch?v=gzUC1yyAtW4.
A PF, portanto, não é diferente da PM apesar de aquela ser CIVIL. Ambas, para a formação de seus quadros, têm um currículo eminentemente policial com carga horária significativa de matérias voltadas à proteção das pessoas, primando pela garantia da vida, da lei, da ordem e dos direitos humanos, e cargas horárias destinadas a grupos especiais específicos para o exercício de missões que requeiram treinamento especial e adequado a ações destinadas a atividades militarizadas.
Acerca da questão da letalidade abordada pelo delegado, trata-se de uma comparação descabida. Vejamos: 1) A PF atua em operações de natureza militarizada, mas de fácil coordenação e execução, como cumprimentos de mandados de busca e apreensão em residências habitadas por supostos criminosos que não detêm periculosidade, sempre contando, inclusive, com efetivos imensamente superiores em pessoal e armamento aos dos presos, que nunca reagem. Estas operações são previamente conhecidas e a antecedência permite o seu planejamento com detalhes, o que diminui significativamente a possibilidade de erros, os quais se tornam insignificantes e em níveis que, mesmo ocorridos, não são suficientes para prejudicar a missão. 2) As PMs, no entanto, lidam com o que pode ser chamado de “lixo da sociedade”, como, apenas para exemplo, criminosos voltados ao tráfico de drogas e de armas, sempre muito bem armados e municiados, devidamente treinados, que sempre resistem às prisões e em condições de superioridade de posição no terreno e bélica, cujo armamento de resistência e de combate transita com facilidade pelas nossas fronteiras, cuja responsabilidade de cuidar é da própria PF. E quando não é assim, os policiais militares que atuam diariamente no policiamento de rotina nas ruas, são obrigados a se desdobrarem e fazerem toda sorte de malabarismos para não morrerem no confronto com assaltantes, normalmente em maior número que os policiais, muitas vezes um único a policiar a via pública.
Por fim, esclareço que, apesar de ser oficial da PM do RS (Brigada Militar), sou absolutamente indiferente à supressão da condição adjetiva de militares das PMs, dado que não será um mero adjetivo que terá a capacidade de torná-las mais ou menos eficientes, mas o seu preparo para a atividade policial e - que hoje está muito em falta - o apoio dos governantes responsáveis pelas garantias de proteção aos policiais, seja por meio da disponibilização de equipamentos de segurança, seja pelo bloqueio das fronteiras por onde passam drogas, armas e munições que abastecem o mercado do crime e que obriga as polícias Estaduais, em especial as PMs, a estarem quase que permanentemente envolvidas em operações para combater esta espécie de crimes e de criminosos. Operações que seriam diminutas e com riscos de letalidade também diminutos se o papel de cuidar e proteger as fronteiras fosse feito da forma que merece e exige a segurança pública.
Peço, Sr. Alexandre, desculpas pela extensão do texto, mas espero que a sua bondade e paciência lhe tenha permitido chegar até aqui. Cumprimentos pelo seu trabalho, ao qual, assim como à sua pessoa, tenho imensa admiração.
ALBERTO AFONSO LANDA CAMARGO